Ninguém se preparou para ela, é um mundo desconhecido. Finalmente ela chegou, chegou a hora tão esperada de pendurar as chuteiras, ficar livre de horários apertados, acabar com o corre-corre da vida. Não precisar mais aturar o chefe exigente e implicante. O nosso sonho dourado, sonho que cultivamos durante uma vida inteira no trabalho, vai virar realidade. Temos um monte de planos que poderemos realizar. Sem horários obrigatórios, transportes superlotados, almoçar qualquer coisa mais barata que podemos pagar. Agora estamos com a vida que pedimos a Deus: sombra e agua fresca. Temos todo o tempo para descansar, viajar, visitar os amigos, enfim, com o diz o caipira “ficá di papo pru ar”.
Antes não tínhamos tempo para nada, agora temos todo o tempo do mundo para fazer o que? Para não fazer mais nada? Essa é a grande questão: como se ocupar, fazer algo para que as horas não demorem tanto para passar. E nossos sonhos, nossos planos para só fazer o que seja de nosso agrado. Alguns ficam horas e horas nos barzinhos da periferia, jogando conversa fora, dominó, damas ou baralho, enchendo a cara e chegando em casa na manguaça e ouvindo broncas da mulher. Será que essa é a vida que pedimos a Deus? Com a aposentadoria você rompe com uma série de relações com seus colegas de trabalho e acaba perdendo o eixo que consistia a sua vida. Victor Hugo, o célebre escritor francês afirmava que aposentar-se equivale a descer ao túmulo, ainda em vida. Outra coincidência: a aposentadoria e o envelhecimento, a perda da autonomia e a necessidade de contribuir para a vida da família, apesar da parca aposentadoria que recebe.
A sociedade não reconhece o idoso como consumidor e ele não é objeto de qualquer publicidade. Só o novo, o moderno, o atual é valorizado. A imprensa apregoa: troque o seu carro velho por um novo, mais moderno e muito melhor. Muitos idosos são obrigados a gastar com a alimentação, praticamente tudo que recebem. Se compram comida, não compram remédio e vice-versa. É uma escolha perversa que abala a sua auto estima. Frankl, um psicólogo alemão afirmava que todo o ser humano tem necessidade de sentir útil e o aposentado se sente um inútil, marginalizado, na beira da estrada da vida. A verdade é exatamente essa que acontece.
Os amigos de outrora nem sempre estão vivos e sem doenças. Alguns se mudaram para outros bairros ou cidades. O ócio leva ao isolamento e ambos provocam a depressão. Bastante comum em idosos aposentados. Os homens são os que mais enfrentam esses problemas, já que as mulheres, mesmo as aposentadas, sempre se sentem úteis, gerenciando a casa, providenciando as compras ou acudindo os filhos e os netos nas dificuldades ou doenças do dia a dia.
O índice de sobrevida das mulheres é bem maior do que os homens e alguns pesquisadores apontam as causas dessa diferença: as mulheres sempre tiveram muitas relações com as amigas, na comunidade, na vizinhança, com os parentes, dessa maneira não se sentem isoladas. Já os homens perderam os laços que mantinham apenas com seus colegas de trabalho, mais nada. A denominação de “sexo forte” logo é usada para o antigo “sexo frágil”.
Simone de Beauvoir afirmava: é preciso buscar na aposentadoria outras ocupações, participar de associações, dedicar-se a atividades voluntárias, dedicar-se ao proselitismo politico ou religioso, clubes, movimentos sociais, dar um significado à sua vida enfim, é imprescindível buscar uma atividade à sua escolha, mesmo sem a obrigação de cumprir horários rígidos. É preciso escapar ao tédio e a decadência, continuando na lida de se ocupar, não ficar encerrado em sua casa, nesse caso uma verdadeira prisão.
Muitas vezes a aposentadoria é associada à ideia da proximidade da morte, causando isolamento e depressão, ocasionando a perda do gosto de continuar a viver. Os homens percebem que se afastaram do palco da vida, se transformando, de protagonistas a um mero expectador passivo, não influindo nem nas decisões que lhe dizem respeito. Para piorar a sua situação, os seus direitos previstos em várias leis, são ignorados pela maioria da sociedade, da imprensa e até das autoridades governamentais.
Afinal o idoso não precisa e não quer bondades, tutelas, esmolas ou qualquer outro tipo de auxilio. Ele simplesmente exige que seus direitos sejam respeitados. Só isso, tão somente isso, mais nada. Ele não recebe o respeito que mereceu após tantos anos de trabalho. Todos querem viver bastante, mas não querem ficar velhos, por causa de todos esses preconceitos, injustiças, discriminações e violências. Esse é um comportamento cruel e desumano, que provoca a revolta, a indignação, o inconformismo de todas as pessoas de bem. Até quando isso vai continuar acontecendo? Não depende de nós. É preciso que haja uma metanóia, uma mudança de comportamento da sociedade e acontece que toda mudança demanda tempo é traumática e problemática e difícil de se concretizar....
Essa mentalidade retrógrada, medieval e completamente ultrapassada também está presente nos chamados países desenvolvidos, de primeiro mundo, não tão marcante mas ainda distante do ideal. O mundo atual é dirigido para um consumismo selvagem e desenfreado, onde são propagadas e vendidas muitas coisas completamente desnecessárias. O que hoje é moderno e atual logo é substituído por novos produtos mais sofisticados e dispendiosos, num circulo vicioso, que se renova em curtos períodos. É a apologia e a exaltação do novo, do belo, do moderno, em detrimento do velho, feio, antigo e ultrapassado. Então, somente o que é novo tem valor. Daí a dedução que o que é velho é ultrapassado, sem nenhuma utilidade e deve se descartado....
CONCLUSÕES
Diante desse contexto, será que o aposentado está num beco sem saída? De maneira alguma, existem muitas alternativas que podem transformar essa fase da existência em uma realidade muito diferente, uma época de muitos ganhos, superando de longe, algumas perdas naturais do processo do envelhecimento, comuns a todos. Há possibilidades de converter essa fase da vida em uma época feliz, até mais feliz do que as outras, evitando o isolamento e a depressão. Basta lutar, não se acomodar, ir atrás, perseguir e se empenhar. Nada de concordar com o que pregam os arautos do falso progresso, mas que deveria ser chamado de verdadeiro retrocesso.
A saída desse labirinto só pode ser percebida e achada pelos que passaram pela aposentadoria e conseguiram ser felizes, mais felizes até do que em épocas anteriores. Listar essas atividades é uma tarefa muito extensa, tantas são as possibilidades. Vamos citar apenas algumas:
1) - Sindicatos de aposentados.
2) – Clube de esportes.
3) – Conselhos gestores da saúde e da segurança dos bairros onde moram.
4) – Proselitismo e militância política.
5) – Aprender a tocar um instrumento musical.
6) – Dedicar-se a habilidades manuais: pintura, marcenaria, fotografia e similares.
7) – Melhorar sua qualidade de vida, com alimentação saudável, atividades físicas e controles periódicos de saúde.
8) – Os bailes da terceira idade são ótimas oportunidades de fazer novas amizades, além da atividade física desenvolvida.
9) – Esmero e apuro na aparência pessoal, para aumentar sua auto estima.
10) – O bom humor também ajuda, conte piadas e ria de tudo, até da própria vida, procure levar tudo na esportiva.
11) – Filiar-se às associações de moradores locais.
12) – Frequentar centros de convivência, onde se reúnem idosos para discutir problemas, viajar em grupo, fazer visitas a museus, etc.
13) – Estudar e aprender um outro idioma.
14) – Aproveitar as lições que a vida dá, a cada dia. Vivendo e aprendendo.
15) – Aderir às pastorais locais de saúde.
16) – Participar da luta para que seus direitos sejam respeitados.
17– A jardinagem é outra prática benéfica.
18– Aprender informática, um ótimo meio de corresponder-se com amigos e parentes distantes e ampliar seus conhecimentos.
19– Dar aulas de alfabetização de adultos.
20– Ir a cinemas, teatros, fazer viagens, excursões com grupos de idosos.
21– Escrever suas memórias, a partir das origens familiares até os netos ou bisnetos.
22– Conviver com os netos, participando e ensinando novas brincadeiras, contando histórias e passeando com eles.
23– Visitar asilos e casas de repouso para idosos. É possível adotar um idoso abandonado pela família. E visitá-lo periodicamente.
24– Ajudar vizinhos, amigos e outros idosos, que necessitarem de auxilio. Ajudar os outros é ajudar-se.
25– Existem dezenas de entidades que necessitam de voluntários e até fazem cursos de capacitação para familiarisá-los com a sua nova missão.
26 - Atividades voluntárias de todo o tipo, resultam em grande gratificação, trazendo benefícios à saúde e paz, com a certeza da missão cumprida. Esse resultado é confirmado por várias pesquisas feitas por diversas universidades norte-americanas.
27– Para amar os outros, primeiro é preciso amar-se, gostar de viver, para depois amar os outros. O evangelho afirma textualmente ”amai o próximo como a vós mesmos. Ou ainda: não façais aos outros o que não quereis que vos façam”. Percebo que agora, depois de tudo o que foi explicitado, não é preciso dizer mais nada. Já chega, é suficiente, agora só é preciso pôr em prática. CARPE DIEM.
DR.OSCAR DEL POZZO – E-MAIL: solidosos@uol.com.br
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